sexta-feira, 25 de maio de 2007

Entrevista da Comunidade Discutindo Literatura

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com Antônio Lázaro de Almeida Prado .
Perguntas de Irene Vieira.


1-Cite todas as suas obras, inclusive traduções .

Sendo jornalista, desde 1944, e havendo colaborado em jornais de Piracicaba, São Paulo, Assis e de outros centros, o número de colaborações de caráter literário e de exercício da Crítica Literária é elevadíssimo e praticamente impossível de arrolar.

Pela Faculdade de Ciências e Letras do Campus de Assis publiquei os livros O Acordo Impossível (análise da obra de Cesare Pavese) e Itinerário Poético de Salvatore Quasímodo. Pela Revista de Letras publiquei artigos e resenhas científicos. Publiquei ao ensejo do centenário da cidade de Assis: Assis/Passado/Presente e Futuro. E recentemente pela editora Ateliê, o livro de poesias Ciclo das Chamas e outros poemas. E, as seguintes traduções: Leon Poirier (Um Homem Chamado Francisco de Assis), de Gaëtan Picon (O Escritor e sua Sombra), de Giambattista Vico (Ciência Nova), e de Giuseppe Ungaretti (Invenção da Poesia Moderna).


2-Fale sobre seu primeiro poema.

Ainda na infância, alem de participar do Orfeão-Mirim Piracicabano, (o que indica sensibilidade aos valores sonoros e rítmicos, escrevi poemas bastante singelos e compatíveis com a idade, em geral voltados para celebrações de afetos familiares. Isso ocorreu entre meus 8 e 9 anos. Desses poemas (curtos, como convinham para um pequeno caderno de notas) guardo muito escassa memória.

Voltei à poesia no meu estágio ginasial e já então percebi que a poesia podia traduzir tantos momentos alegres e eufóricos quanto a dor pela perda de um grande amigo, Thales Estanislau do Amaral (sobrinho de Tarsila Amaral).

E, então, ensaiei tanto o domínio de versos curtos, quanto o de idílios, sonetos, etc.

Cumpridos quatro anos (intermediários) de acentuada formação clássica(grego, latim, português, italiano, História) retomei os estudos no Instituto de Educação Sud Mennucci e nele freqüentei o Curso Clássico (Português, Francês, Inglês, Espanhol, Latim).

Foi lendo poemas de Manuel Bandeira que percebi possíveis as práticas do indevidamente chamado "verso livre", ao lado de poemas de fundo clássico.

Então, ao cursar Letras Neolatinas na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, escrevi poemas em inglês (pouquíssimos), espanhol, francês e italiano, ao lado de poemas em português. Poemas que fui publicando em jornais de Piracicaba e São Paulo.

Dos primeiros poemas(de infância) busco recapturar os valores de comunicabilidade e combiná-los com a leitura e observãncia das sugestões dos grandes poetas da Literatura Universal.


3-Momentos de rupturas, avanços na sua trajetória poética.

Como já fiz notar, os primeiros poetas, que me sensibilizaram, foram os que aprendi a admirar entre os gregos( os líricos, os épicos e os dramáticos), os latinos e os da tradições clássicos românicos e anglogermânicos.

Com o curso de Neolatinas passei a ler, intensamente, autores italianos, franceses, espanhóis, ingleses, brasileiros,portugueses, alemães,....

Assim, não houve propriamente rupturas, mas aberturas para a produção poética Universal.

Essa abertura ensinou-me que a poesia, tanto para recebê-la, quanto para produzi-la cobra e exige as melhores virtualidades humanas.


4- Como foram seus encontros com escritores e quais suas afinidades com alguns.

Pela leitura, meu encontro com escritores iniciou-se muito cedo.

Das leituras infantis destaco as obras de Monteiro Lobato e de Thales Castanho de Andrade, que, mais tarde foi meu professor de História no Ginásio. Dos 13 aos 17 anos li autores gregos, latinos e italianos, mais Vieira, Bernardes, Camilo, Rui Barbosa, e através de uma Antologia de Estevão Cruz, tomei contacto com os grandes poetas brasileiros, inclusive os Modernistas.

Quanto a contacto pessoal, desde 1944 participei de Congresso de Escritores e conheci muitos autores brasileiros. Na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP pude conviver com autores internacionais, o que se deu também no Campus de Assis da UNESP, em encontros de Crítica e de História Literária, em Cursos Pós-Graduatórios, que ministrei.

Dentre os poetas que admiro Gonçalves Dias, os Árcades mineiros, Cruz e Souza, Manuel Bandeira, Mario de Andrade, Osvald de Andrade, Drummond, João Cabral de Melo Neto, e, particularmente, Murilo Mendes, Adélia Prado, Jorge de Lima, Dora Ferreira da Silva.

Claro está que tenho muito apreço pelas várias correntes de Vanguarda posteriores a 1922.


5-O senhor lê em várias línguas. Cite autores estrangeiros indispensáveis a um jovem poeta.

Para um jovem poeta (no caso, brasileiro) a leitura de Drummond, Bandeira, João Cabral, Jorge de Lima, Murilo Mendes, Cecília Meireles, os das gerações posteriores a 1945...

Mas muito Dante, Petrarca, Shakespeare, Cervantes, Lorca, Rilke, Baudelaire, Eliot, Antonio Machado e tantos e tantos outros...


6- Como conciliar Teoria e Criação Poética?

Teoria e Criação Poética, principalmente se a Teoria Literária e a Literatura Comparada se vistos como convite à recepção e à produção poética, não se opõem, mas podem até ser de recíproco proveito.

A Leitura dos poetas, quanto mais ampla e quanto mais intensa, ajuda-nos bastante, porque nos propõe emulação e desafio (amistosos).


7- Quais as tendências da nova poesia brasileira (hoje)?

Com alguma antecedência sobre alguns teóricos e críticos, as práticas da produção e da Teoria Literária e da Literatura Comparada, fizeram-me supor (e praticar) uma poesia voltada para a Civilização Solidária, com ênfase para o encontro, a convivência e a prática da Liberdade.

No fundo, no fundo, sempre me pareceu que a Poesia é, por sua própria essência, difusiva, sempre uma proposta de encontro e solidariedade.

Parece-me que os poetas atuais buscam, sempre mais, registros e níveis de linguagem, que saibam conciliar rigor construtivo e liberdade expressivo-comunicativa.

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Fernanda e o poeta Almeida Prado

COMPARTILHADO


Solitário indivíduo estendo pontes
E solidário me faço além do espaço
Exíguo deste corpo agreste e lasso,
Navegando para além dos horizontes.
Compartilhada vida só em parte
Pois que, por outra parte, fujo à ilha,
E desfruto a perpétua maravilha
De à angusta solidão fugir com arte.
Solitário, mas sempre solidário,
Fugindo ao tempo precário e repartido,
No bem do amor encontro o meu sacrário
E tudo o que é bem meu eu condivido
Não vendo noutro ser algo contrário
Mas o que faz o inferno suprimido.

Assis, 15 de junho de 2007

Antônio Lázaro de Almeida Prado



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:::::::::::::::::: EXERCÍCIOS DA VOZ ::::::::::::::::::

Interlúdio paulistano (1) 

 

Antônio Lázaro de Almeida Prado 
 

O que mais atrai na “Paulicéia Desvairada” é essa oferta, em leque, de opções artísticas.

Participei, com Poeta convidado, de mais um sarau na Casa das Rosas (Espaço artístico Haroldo de Campos).

Nessa mesma Casa das Rosas surpreendeu-me e encantou-me a exposição multimídia de uma artista do Sul, que já traz (na vida e na Arte) o destino no nome: Rosae Novichenko (Rosângela Nowitschenko).

Trata-se de uma jovem catarinense, que, como tantos artistas, expõem e/ou trabalham (artisticamente) em São Paulo e na capital paulista oferecem, generosamente, a quantos concordem com Keats: “o belo é uma alegria para sempre”, os dons de sua criatividade e competência criadora.

Rosae/Rosângela (pluralmente Rosa e singularmente ângela (anjo) é da estirpe dos que olham, com ternura e lucidez, esse imenso território terrestre, em que decorre nosso estágio vital, que, aliás, se cumpre aqui e para além dessa admirável Terra.

Com técnicas artísticas inovadoras (uma das quais é a produtiva técnica mista do uso de nanquim, grafite e esmalte de unha) Rosae coincide com virtuosismo floral de Botticelli) e instaura um universo artístico germinador, em que os reinos mineral, vegetal, animal (e mais especificamente humano) se abraçam num enlace de imanência e transcendência, de admiráveis efeitos formais e colorísticos.

Corpos femininos esplendentes florescem em rosas e habitam o território edênico da terrestridade e dos sonhos, esse mesmo corpo feminino desabrocha em quase audíveis sons de violinos e celos, temperados de efeitos oníricos e de formas ora evanescentes, ora concretíssimas.

Em tudo a dimensão de grandeza dos sonhos mais encantados, a placidez das formas, a festiva alegria dos adornos, o êxito do refinamento artístico, o requinte do artesanato perfeito.

Parece-me que a presença artística do Sul brasileiro, há pouco representada pela admirável arte fotogrática de Adriana Füchter, confirma-se nesta exposição, por todos os títulos preciosa, de uma jovem catarinense que busca, com pertinência (e o consegue) chegar àquela incidência da beleza que, para Keats, é uma alegria para sempre.

Artistas de almas irmãs mestre Botticelli e a nossa Rosae Novichenko, com saber e sabor, enriquecem nossa vida, fazendo-nos sintonizar com uma ênfase artística, que embeleza a beleza natural e nos encanta.

Temos que pedir a Rosae que prossiga na credenciada revelação da beleza da vida e dos instantes lúcidos dos sonhos. 

Assis, 24 de junho de 2007 

E-mail: professorprado.prado@gmail.com

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:::::::::::::::::::::: EXERCÍCIOS DA VOZ ::::::::::::::::::::::::

Interlúdio paulistano (2) 

 

Antônio Lázaro de Almeida Prado 
 

  “Habitué” do MASP, volto a ele, e vejo a exposição de Darwin, mas na verdade, como uma ocasião feliz, a mais, para rever as obras de Paul Cézanne (1839-1906), já vistos no MASP e em Paris, sempre com o mesmo encantamento de quem considera Cézanne um dos grandes mestres da Pintura e das correntes pictóricas atuais.

Difícil encontrar quem consiga emparelhar com Cézanne na destreza de obter, através de massas colorísticas, a sensação de dimensão, quase tangível, de frutas, panoramas, pessoas, árvores e (quase diria) de cidades captadas através de artísticas formas geométricas.

A chamada “natureza morta” (tantas maçãs, tantos pêssegos, tantas laranjas – todas tentadoras) parece que tratadas por essa hábil mão, que ao modo de Michelangelo, “ubbidisce all’intelletto: que obedece à inteligência), a “natureza morta”, assim com a vida vegetativa de tantas árvores majestosas, tudo isso ganha vida, graças a essa espécie de humanização Ersatz, que lhe confere Cézanne.

Jogadores parecem manter expectativas (e até disfarces e truques) de apostadores, mas perante um público, formado por quantos têm o privilégio de contemplar a tela.

E o relevo das formas humanas, obtido a partir do justo emprego de massas colorísticas e de linhas!...

Um quadro, uma pintura, disse uma vez um crítico artístico sagaz, não é mais do que “uma superfície plana, recoberta de cores e linhas”. Ora, a descoberta da perspectiva, por exemplo de um Giotto (O beijo de Judas), ou dos renascentistas mais capazes, ou a admirável construção de perspectiva, a partir sempre, de cores e linhas, se não me equivoco, vale como um traço definidor de gênios e de talentos.

Parece-me que as vanguardas do século XX, através de seus mais credenciados artistas, abeberaram-se nesta fonte inspiradora de talento e de artesanato que se chama Paul Cézanne... 

*

*               * 

Fui ver também o acervo do MASP concernente à obra de Toulouse Lauterc (1864-1901).

Confesso (e não sei bem explicar o porquê) que sempre vejo no traçado leve (quase diria caricato) de Lautrec uma antevisão de fim-de-linha da chamada “Belle Époque”.

Sinto em Marcel Proust (1871-1922) um encantamento pela “douceur de vivre”, que se traduz num estilo tão caprichoso quanto o da arte dos vitrais, atento a particulares expressivos, que me parecem até uma tentativa de preservação (escrita e sugerida) de um tempo que ele tanto amou e que melancolicamente percebe que precisa de uma nova “Commedia”: a do resgate das palavras...

Mas Toulouse Lautrec, sem a gravidade de um Miserere de Rouault, parece mais interessado em não tomar muito a sério os ritos, as pompas e o “savoir faire” da “Belle Époque”.

Lautrec tem para mim o sabor rabelaisiano de quem prefere ao trágico puro, o tragicômico, o riso, ora leve, ora mais acentuado, quase de uma sátira cruel...

Há (suponho) na leveza de dançarinos de cabarés, nos rápidos movimentos de salões e (particularmente no à vontade de cavaleiros e amazonas um certo, como que compensatório, desse nobre francês, reduzido, pela forma física (ou se quiserem a deformidade) a invejar, ora complacente, ora amargo, o ágil, o lépido, o destro, a rapidez de formas e movimentos.

Às vezes me pergunto se Lautrec não buscou uma Ersatzreligion dos movimentos e da perspectividade... Ele, como o nosso talentoso Ranchinho (de Assis) parece ter fixação da força, vigor e energia nos cavalos, que galopam em círculos estreitos, em superfícies limitadas.

E, no entretanto, que captação talentosa de ritmos, da fascínio pelo cambiante e mutável! 

*

*               * 

Terá cabimento dizer-se que a fragrante captação de formas, através de massas colorísticas, em Cézanne, corresponde a um encantamento (preservado) em face da vida, enquanto que o traçado rápido, e a centelha de luz e de sombra em Toulouse Lautrec decantam-se na sátira, tão incisiva, e tão leve, quanto a ele (Lautrec) lhe faltou de bem estar físico?...

De qualquer maneira, admiráveis as gerações artísticas da “Belle Époque” e das vanguardas do século XX na França.

Imagino que até se possa recordar do êxito das gerações renascentistas da Itália...

O fato é que quer desejando perpetuar (Proust), quer conseguindo preservar (Cézanne), quer exercendo uma crítica entre cobiçosa e mordaz (Lautrec) a França pode orgulhar-se de oferecer à contemplação do mundo uma geração artística de grande qualidade... 

Assis, 24 de junho de 2007 

E-mail: professorprado.prado@gmail.com